sexta-feira, 10 de abril de 2009

Continuação

Amigo, onde estava você entre 1985 e 2004?

Você ignora solenemente a luta árdua e perigosa que travamos na Escola Técnica Federal de Campos. Não sabe que quem clamava por democracia nessas plagas era ameaçado, perseguido e até demitido. Ignora que amigos novos, que você corteja hoje, já me taxaram de agitador e criador de caso. Sem falar na “carinhosa” alcunha de xiita que perseguiu uma série de nós no início dos anos 1990. Afinal, quando não fomos vítimas da truculência e do despotismo nessa escola, sob a égide da ditadura militar, fomos alvo da intolerância dos que não se conformavam com a redemocratização do país.

Você não se lembra da luta do professor Luciano D’angelo para ser eleito e empossado em 1986? O primeiro diretor de escola técnica federal eleito no Brasil. Fazendo campanha para o Professor Luciano, Jefferson, alguns dos que hoje admiramos vieram me elogiar pela minha coragem em enfrentar a tirania que grassava na instituição. E eu, idealista, nem achava que era obrigação, fazia simplesmente por prazer! Eu me embriagava na luta pela democracia!

Outros tantos que bradam por liberdade nos corredores hoje, se escondiam ou eram beneficiários do status quo.

Nessa campanha Jeferson eu tinha menos de 30 anos e, ao contrário do que diz sua carta, não tínhamos medo do novo. Nós éramos os novos e por isso discriminados. As pessoas que a sua carta calunia, ao contrário do que diz você, fizeram um pacto de que o novo nessa casa jamais seria visto como ameaça e sim como a semente do futuro. Sejam novas pessoas ou novas ideias. Você é quem levanta pensamentos antigos, mumificados e repetidos por chauvinistas. Quer exemplo? A velha acusação da partidarização da nossa escola. Isso sim cheira a passado, mas um passado tenebroso anterior à idade média. E ainda tem gente que insiste em tentar ressuscitar esses ideais.

Você ignora a luta para transformar a ETFC em Cefet, apesar do neoliberalismo reinante no governo FHC. Você sabia que foi muito mais difícil virar Cefet do que virar IFF? O governo do príncipe dos sociólogos era contra. Diferentemente do governo Lula – que você chama na sua carta de novo governo (será que há constrangimento seu em defender Lula em função das novas alianças que você anda fazendo com o PSTU e os conservadores locais ou seria mais um ato falho?). O governo do presidente Lula, Jefferson, não só foi a favor do IF como regeu esse processo, apesar de muitos dos seus atuais aliados terem sido contra.

Nisso tudo não podemos deixar de louvar a fundamental participação do Professor Luiz Augusto Caldas Pereira, que colaborou de forma inexorável na transformação da ETFC em Cefet e é um dos artífices do desenho da rede de Institutos Federais. Aliás, Luiz também foi membro desta direção que você renega e mais: foi essa direção passada que se uniu e ungiu Luiz diretor geral do Cefet Campos. Eu trabalhei muito pra isso, Jefferson! Apesar de já estar no Cefet onde estava você nesse momento? Estando entre nós por que resolveu banir este capítulo do seu currículo na sua epístola?

O mais estranho disso tudo é você esquecer que Luiz é produto do nosso meio. Estranho você achar que pode intrigar Luiz com a gente. Os mandatos de Luiz, Jefferson, são resultados de um processo que começa quando ele entra na ETFC como aluno. Passa pela sua amizade com o professor Roberto Moraes quando eles ainda, na década de 1980, eram professores do curso de Eletrotécnica. Passa pela nossa tentativa romântica de dirigir a Assetec em 1987. Passa pela amizade entre ele e a professora Cibele surgida da colaboração estreita entre eles quando ela teve um papel destacado na presidência da Assetec. Passa pelos cinco anos que Luiz brilhantemente cumpriu como diretor de ensino na direção do professor Roberto Moraes. Aliás, o professor Roberto Moraes, que a sua carta joga na vala comum das calúnias, onde nos acusa de defensores do continuísmo, tinha direito a um mandato de seis anos e abriu mão de um em função de defender a eleição.

A minha admiração por Luiz foi forjada na luta, no cotidiano do trabalho, antes mesmo de ocuparmos qualquer cargo aqui no Cefet e ele no Mec. Não é adesismo recente de quem se deslumbra gravitando os palácios do poder.

 

Meu caro pobre Jefferson, como foram infelizes algumas afirmações da sua desafortunada missiva. Eu nunca tinha visto você proferir afirmações tão reacionárias como dizer que: “a escola estava com uma coloração partidária muito forte” ou que “essas pessoas [seja elas quais forem] querem se valer do desenho regional do IFF para tirar proveito político partidário”.

Quem anda pautando seu discurso, meu caro? Quem anda fazendo a sua cabeça? Essas acusações são velhas, estão surradas, são chauvinistas, beiram o fascismo e não cabem na cabeça de um jovem como você. Muito menos de um jovem que anda tanto falando em classe trabalhadora e sempre disse defender os excluídos.

Caso você não saiba, isso faz parte de uma estratégia vil de alienar, por meio do descrédito, a política partidária e facilitar o trânsito dos políticos cínicos. Ao mesmo tempo que se presta a esse papel descredencia adversários que têm vida partidária ativa. Você é bastante esclarecido e experiente pra cair numa armadilha tão grotesca. Aliás, você ainda é filiado ao PT ou vai pedir desfiliação por coerência com o seu novo ideário político?

Quanta ironia, você escolhe para espalhar por spam[1] um texto repleto de ideias conservadoras e politicamente retrógradas justamente no dia 31 de março de 2009. Ou seja, aniversário do golpe militar de 1964. Podia ter deixado pro dia seguinte, o primeiro de abril. É dia da mentira. Tinha ficado mais charmoso!

A sua carta descredencia você em dois quesitos, companheiro. Primeiro o homem, que se mostra imaturo para os embates da política institucional. Segundo, o candidato que se mostra despreparado por conhecer tão pouco a instituição, sua história e seus valores. Espero que tenha sido apenas imaturidade e ignorância, pois ambos os problemas são fáceis de sanar.

Concluindo, amigo, gostaria de reafirmar que não o vejo como inimigo nem o condeno na essência, mas não posso me furtar de vê-lo se enredar em caminhos tão obscuros e ficar calado. Sempre agi assim com você e considero esse o momento mais infeliz da sua trajetória. Todos cometemos erros. Eu mesmo os coleciono a cântaros, entretanto não me peça fidelidade no erro. Por princípio eu sou leal, pois não comungo com o erro do amigo e peço que faça o mesmo comigo sempre que me vir assim, como você está, numa situação de desatino.

(...) na origem da cidade dos justos está oculta, por sua vez, uma semente maligna; a certeza e o orgulho de serem justos – e de sê-lo mais do que tantos outros que dizem ser mais justos que os justos –, fermentando rancores, rivalidades, teimosias, e o natural desejo de represália contra os injustos se contamina pelo anseio de estar em seu lugar e fazer o mesmo que eles. Uma outra cidade injusta, portanto, apesar de diferente da anterior, está cavando o seu espaço dentro do duplo invólucro das Berenices justa e injusta (Calvino, 1990, p. 147)[2].

 

Aguardo você onde sempre estivemos.

Um abraço,

Helinho.



[1] O termo , abreviação em inglês de “spiced ham” (presunto condimentado), é uma mensagem eletrônica não-solicitada enviada em massa.

Na sua forma mais popular, um consiste numa mensagem de correio eletrônico com fins publicitários. O termo spam, no entanto, pode ser aplicado a mensagens enviadas por outros meios e noutras situações até modestas. Geralmente os spams têm caráter apelativo e na grande maioria das vezes são incômodos e inconvenientes.

 

[2] CALVINO, Italo. As cidades Invisíveis. São Paulo: Companhia das letras, 1990. 150 p.

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